BAKHTIN EM TRECHOS
Principais contribuições de M. Bakhtin para o estudo da linguagem e da literatura
“Portanto, por trás de cada texto está o sistema da linguagem. A esse sistema correspondem no texto tudo o que é repetido e reproduzido e tudo que pode ser repetido e reproduzido, tudo o que pode ser dado fora de tal texto (o dado). Concomitantemente, porém, cada texto (como enunciado) é algo individual, único e singular, e nisso reside todo o seu sentido (a sua intenção em prol da qual ele foi criado). É aquilo que nele tem relação com a verdade, com a bondade, com a beleza, com a história.” (BAKHTIN, 1998)
“Na realidade não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial” (BAKHTIN, 1998)
“...a língua não se transmite (...). Os indivíduos não recebem a língua pronta para ser usada; eles mergulham na corrente de comunicação verbal e somente quando isto ocorre é que tomam consciência de si e do mundo que os cerca”. (1972, p. 108)
“Os sujeitos não ‘adquirem’ sua língua materna; é nela e por meio dela que ocorre o primeiro despertar da consciência”
“Toda enunciação, mesmo na forma imobilizada na escrita, é uma resposta a alguma coisa e é construída como tal. Não passa de um elo na cadeia dos atos de fala”
O próprio Deus teve que encarnar-se para amar, sofre e perdoar, teve, por assim dizer, de abandonar um ponto de vista abstrato sobra a justiça. A existência se instaura, de uma vez por todas, entre mim, que sou único, e todos aqueles que são outros para mim e, daí em diante, qualquer ato e qualquer juízo só podem ser feito a partir dessa posição que eles postulam enquanto tais.(BAKHTIN, 1992, p. 143).
a palavra penetra literalmente em todas relações entre indivíduos, nas relações
de colaboração, nas de base ideológica, nos encontros fortuitos da vida cotidiana, nas relações de caráter político, etc. As palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e servem de trama a todas as relações sociais em todos os domínios.(BAKHTIN, 1997, p. 41)
“discurso é um fenômeno social em todas as esferas de sua existência” (BAKHTIN, 1993, p.71)
"Até hoje ainda existem na linguística ficções como "ouvinte" e o "entendedor" (parceiros do "falante", do "fluxo único da fala" etc). Tais ficções dão uma noção absolutamente deturpada do processo complexo e amplamente ativo da comunicação discursiva. Não se pode dizer que esses esquemas sejam falsos e que não correspondam a determinados momentos da realidade; contudo, quando passam ao objetivo real da comunicação discursiva eles se transformam em ficção científica. Neste caso, o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (linguístico) do discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente), completa-o, aplica-o, prepara-se para usá-lo (...). Portanto, toda compreensão plena real é ativamente responsiva e não é senão uma fase inicial preparatória da resposta (...). Cada enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de outros enunciados." Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal, p. 271-272.
"O desconhecimento da natureza do enunciado e a relação diferente com as peculiaridades das diversidades de gênero do discurso em qualquer campo da investigação linguística redundam em formalismo e em uma abstração exagerada, deformam a historicidade da investigação, debilitam as relações da língua com a vida." Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal, p. 264-265.
"O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da atividade humana." Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal, p. 261.
“É possível dizer que dialogismo é o modo de funcionamento real da linguagem, que se articula sempre entre relações de enunciados. Além desse dialogismo constitutivo, temos o composicional, pelo qual o locutor incorpora vozes de outros de forma expressa (discurso objetivado) ou não (discurso bivocal). É possível ainda um terceiro conceito de dialogismo, no qual a noção de que o sujeito se constitui historicamente e a partir dos outros é determinante para sua própria ação”.
"Por isso o enunciado é representado por ecos como que distantes e mal percebidos das alternâncias dos sujeitos do discurso e pelas tonalidades dialógicas, enfraquecidas ao extremo pelos limites dos enunciados, totalmente permeáveis à expressão do autor. O enunciado se verifica um fenômeno muito complexo e multiplanar se não o examinamos isoladamente e só na relação com o seu autor (o falante), mas como um elo na cadeia da comunicação discursiva e da relação com outros enunciados a ele vinculados (essas relações costumavam ser descobertas não no plano verbalizado - estilístico-composicional - mas tão-somente no plano semântico-objetal)." Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal, p. 299.
“aquele que apreende a enunciação de outrem não é um ser mudo, privado da palavra, mas ao contrário um ser cheio de palavras interiores” (p. 147)mfl
a linguagem vive na comunicação dialógica daqueles que a usam” (p. 158). PPD
“A língua, como sistema de formas que remetem a uma norma, não
passa de uma abstração, que só pode ser demonstrada no plano teórico
e prático do ponto de vista do deciframento de uma língua morta e do
seu ensino. Esse sistema não pode servir de base para a compreensão e
explicação dos fatos lingüísticos enquanto fatos vivos e em evolução”
(Bakhtin: 1988:108).MFL
“(...) todo o discurso concreto (enunciação) encontra aquele objeto
para o qual está voltado sempre, por assim dizer, já desacreditado,
contestado, avaliado envolvido pela névoa escura ou, pelo contrário,
iluminado pelos discursos de outrem que já falaram sobre ele”
(Bakhtin, 1988:86).
“ todo discurso é orientado para a resposta e ele não pode esquivar-se à influência profunda do discurso da resposta antecipada” (p. 89)
“a resposta compreensível é a força essencial que participa da formação do discurso e, principalmente, da compreensão ativa, percebendo o discurso como oposição ou reforço e enriquecendo-o” (p. 89)
“A compreensão amadurece apenas na resposta. A compreensão e a resposta estão fundidas dialeticamente e reciprocamente condicionadas, sendo impossível uma sem a outra” (p.90)
“a todo instante se encontra nas conversas ‘uma citação’ ou ‘uma
referência’ àquilo que disse uma determinada pessoa, ao que ‘se diz’
ou àquilo que ‘todos dizem’, às palavras de um interlocutor, às nossas
próprias palavras anteriormente ditas, a um jornal, a um decreto, a um
documento, a um livro, Tc...” (Bakhtin, 1988:140).
“Com base no que foi dito, pode-se afirmar que na composição de
quase todo enunciado do homem social desde a curta réplica do
diálogo familiar até as grandes obras verbal-ideológicas (literárias,
científicas e outras) existe, numa forma aberta ou velada, uma parte
considerável de palavras significativas de outrem, transmitidas por um
ou outro processo. No campo de quase todo enunciado ocorre uma
interação tensa e um conflito entre sua palavra e a de outrem, um
processo de delimitação ou de esclarecimento dialógico mútuo (...)”
(Bakhtin, 1988:153)
“As palavras do outro, introduzidas na nossa fala, são revestidas inevitavelmente de algo novo, da nossa compreensão e da nossa avaliação, isto é, tornam-se bivocais" (p. 169).
“A compreensão responsiva nada mais é senão a fase inicial e preparatória
para uma resposta (...). O desejo de tornar seu discurso inteligível é apenas um elemento abstrato da intenção discursiva em seu todo” (p. 291).
“O objeto do discurso de um locutor, seja ele qual for, não é objeto do
discurso pela primeira vez neste enunciado, e este locutor não é o
primeiro a falar dele. O objeto, por assim dizer, já foi falado,
controvertido, esclarecido e julgado de diversas maneiras, é o lugar
onde se cruzam, se encontram e se separam diferentes pontos de vista,
visões do mundo, tendências” (Bakhtin, 1992:319)
“O homem entra no diálogo como voz integral. Participa dele não só
com seus pensamentos, mas também com seu destino, com toda a sua
individualidade”. (Estética da Criação Verbal ([1979], 2003:349),
“A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar do diálogo:
interrogar, ouvir, responder, concordar, etc. Nesse diálogo o homem
participa inteiro e com toda a vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a
alma, o espírito, todo o corpo, os atos. Aplica-se totalmente na palavra, e
essa palavra entra no tecido dialógico da vida humana, no simpósio
universal (Bakhtin, [1979]; 2003:348).
A língua materna, seu vocabulário e sua estrutura gramatical, não os
conhecemos por meio dos dicionários ou manuais de gramática, mas sim
graças aos enunciados concretos que ouvimos e que reproduzimos na
comunicação discursiva efetiva com as pessoas que nos rodeiam
(Bakhtin, [1979]; 2003: 326 ).
A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é função da pessoa desse
interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo pessoal
ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver
ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe,
marido, etc.) (Bakhtin, [1977]; 2004:112).
Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última
análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte
lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa
extremidade, na outra apóia-se sobre o meu interlocutor. A palavra é o
território comum do locutor e do interlocutor (Bakhtin, [1977];
2004:113).
No diálogo cotidiano, na correspondência, essa coincidência pessoal é comum:
aquele a quem eu respondo é o meu destinatário, de quem, por sua vez, aguardo resposta (ou, em todo caso, uma ativa compreensão responsiva). Mas nos casos de tal coincidência pessoal uma pessoa desempenha dois diferentes papéis, e essa diferença de papéis é justamente o que importa. Porque o enunciado daquele a quem eu respondo (com o qual concordo, ao qual faço objeção, o qual executo, levo em conta, etc.) já está presente, a sua resposta (ou compreensão responsiva) ainda está por vir (Bakhtin, [1979]; 2003:302).
Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os
quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada
enunciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados
precedentes de um determinado campo (aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles,
subentende-os como conhecidos, de certo modo os leva em conta. Porque o
enunciado ocupa uma posição definida em uma dada esfera da comunicação, emuma dada questão, em um dado assunto, etc. (Bakhtin, [1979]; 2003:297).
Cada conjunto verbalizado grande e criativo é um sistema de
relações muito complexo e multiplanar. Na relação criadora com
a língua não existem palavras sem voz, palavras de ninguém. Em
cada palavra há vozes às vezes infinitamente distantes, anônimas,
quase impessoais (as vozes dos matizes lexicais, dos estilos,
etc.), quase imperceptíveis, e vozes próximas, que soam
concomitantemente (Bakhtin, [1979]; 2003:330).
BAKHTIN, M. Problemas da Poética de Dostoiévski. RJ: Forense-Universitária, 1981.
____. “O Problema do Texto”. In: Estética da Criação Verbal. SP: Martins Fontes, 1992. p. 327-358.
____. “Os gêneros do Discurso”. In: Estética da Criação Verbal. SP: Martins Fontes, 1992. p. 277-326.
____. Questões de Estética e Literatura: a teoria do romance. SP: HUCITEC, 1988.
____. (Voloschinov). Marxismo e Filosofia da Linguagem. SP:HUCITEC, 1988.
adoro Bakhtin...esse blog me ajudou num trabalho da faculdade
ResponderExcluirOs trechos foram muito bem escolhidos, mas as datas das citações(1979, 1997, 1998) não batem com as da bibliografia no final do artigo. Fiquei meio perdido.
ResponderExcluirAbs
Adorei este blog, me ajudou na monografia, da pôs para a escolha de alguns autores para usar, e concerteza usareio o Bakhtin.
ResponderExcluirolá meu nome é Rita, também moro no Pará. Nossa estou muito feliz de ter entrando no seu blog, pois estou precisando de uma explicação sobre o texto autor e personagem do livro estética da criação verbal de Mikhail Bakhtin e ficaria extremamente agradecida se me ajudasse.
ResponderExcluirDe qualquer forma muito obrigada...
Abraços
A profundidade da teoria de Bakhtin nos faz refletir sobre a origem de nossas convicções e pensamentos. A aparente originalidade de nossos discursos nada mais é que a reprodução combinada de discursos que já ouvimos anteriormente. Daí a fundamentação da frase "você é a média das cinco pessoas com quem mais convive". Pense sobre isso...
ResponderExcluirOlá meu nome é Vera
ResponderExcluirVou realizar um trabalho
Na faculdade, e esse blog é bem bacana para o meu trabalho.
Cara, você é o máximo! FAcilitou com força minha pesquisa. Vou favoritar aqui e compartilhar demais! Xêrus! Obrigada!
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